Este foi o material que o Prof. Dr. Paulo Moisés Nerbas preparou e que serviu de base para os 4 dias de discussão sobre a Doutrina do Santo Ministério.
5) Chamado por tempo determinado
Dentre os autores consultados, raramente encontraremos defensores do chamado por tempo determinado. Parece ter sido consenso entre muitos de nossos teólogos a não-delimitação de tempo para o chamado. Meu colega Dr. Vilson Scholz preparou um parecer sobre o “chamado temporário”, já antes da última Convenção Nacional. É documento rico na menção de fontes que se manifestam sobre o assunto. A tese geralmente defendida por aqueles que se opõem ao chamado temporário é mais ou menos esta: se Deus é aquele que de fato chama os pregadores, então as congregações são apenas os instrumentos para selecionar as pessoas para o trabalho ao qual o Senhor os chamou (At 13.2). Tendo acontecido isso, o pregador está no Ofício e no serviço de Deus e nenhuma criatura pode destituir (tirar o Ofício, Amt) ou demitir o servo de Deus, a não ser que se possa comprovar que o próprio Deus o destituiu e demitiu (Jr 15.19 comparado com Os 4.6). Nesses casos não é a congregação quem propriamente destitui ou demite o pregador; ela apenas executa a destituição e demissão de Deus que se evidenciou. Em não acontecendo isso e a congregação assim mesmo destituir ou demitir seu pastor, ela, que é instrumento, se transforma em senhora do ofício (Mt 23.8 comparado com 2 Tm 4.2,3 e usurpa o domínio e a administração de Deus.Walther, depois de citar uma carta de Lutero, também cita outros teólogos, entre eles, Ludwig Hartmann. Este argumenta que, por trás de um chamado temporário, existem considerações ou opiniões carnais do tipo: “Se a coisa não der certo, a gente consegue se safar sem maiores problemas”. Tais considerações deveriam ser afastadas. Hartmann também adverte que pastores que aceitam chamados em tais condições poderão não desempenhar seu ministério com empenho e fidelidade, mas passarão a ser bajuladores e dirão aquilo que agrada às pessoas.
Um documento da CTRE da LCMS (setembro de 1981) declara que não existe evidência escriturística que indique que todos os chamados devam ser necessariamente permanentes e sem tempo determinado. Cita como exemplo os chamados para as universidades e Seminários do Sínodo. No final do documento, porém, faz a observação de que “a natureza do ministério como continuação do apostolado e como um chamado de Deus faz entender que os chamados são geralmente não limitados por tempo”.
Destaco agora algumas conclusões do Prof. Vilson Scholz:
- As Escrituras não permitem afirmar que sempre é errado limitar temporalmente um chamado. Embora a Escritura pareça indicar que, na igreja apostólica, o apóstolo, e não o povo, determinava quanto tempo devia pregar em algum lugar (Lc 9.4,5), e que a eleição de bispos e presbíteros tinham caráter vitalício, não há indícios de que, em razão disso, todos os chamados tenham de ser por tempo indeterminado.
- Por isso, o “chamado temporário” é uma questão aberta, onde se aplica o princípio: “Tudo que não é proibido é lícito.” À luz disso, um professor do Seminário é chamado por tempo determinado. Pergunto: qual a diferença entre um chamado para um pastor e para um professor do Seminário?
- A praxe da igreja luterana, principalmente no Sínodo de Missouri, tem sido a não-limitação temporal do chamado como regra.
- Na série Confessional Lutheran Dogmatics, vol. IX, p. 158, Kurt Marquardt afirma que a demissão de um pastor, não sendo por motivos bíblicos, é uma contradição, pois é dizer assim para um pastor: “Deus quer o senhor aqui neste momento, mas também quer que daqui a três anos o senhor saia, a menos que nós queiramos que o senhor fique mais três anos.”
- O chamado pastoral, é verdade, tem muito de contrato de trabalho. Inscreve-se, portanto, no regimento da mão esquerda de Deus. Agora, é também mais do que um contrato. É um chamado para o ministério do Senhor através do “rite vocatus” (que envolve eleição pelo povo e confirmação por parte de bispos; Tratactus, 70). Assim sendo, a maneira como se administra essa questão confirma ou desmente o conceito de ministério que se tem. Em outras palavras, não se pode em nome do regimento da mão esquerda de Deus desmentir o que se afirma no regimento da mão direita.
- As funções do ministério estão claramente definidas no Artigo V da CA. Resta saber se a limitação do chamado em termos de tempo não opera com um novo conceito de ministério centrado na eficiência, poder de mobilização, etc., e não tanto em fidelidade na pregação e na administração dos sacramentos. IMPORTANTE!!!!!!
- A limitação temporal do chamado, adotada por princípio, tende a estimular a velha natureza, tanto do pastor quanto da congregação. O pastor, se interessado em ver seu “contrato” renovado, pode facilmente se tornar um bajulador de homens ao invés de ser um fiel servo de Cristo (1Pe 5.2-4; Hb 13.17), e a congregação pode se sentir estimulada a não honrar seu guia espiritual como convém (1Ts 5.12,13; 1Tm 5.17), por saber que “se verá livre” do mesmo em pouco tempo.
- Pela limitação temporal do chamado, procura-se, por via da lei, resolver, ou, ao menos, estabelecer um mecanismo de solução de problemas que requerem uma evangélica “consolatio fratrum”.
- A Escritura Sagrada estimula a admoestação mútua. Vista no sentido congregação-pastor, tal admoestação pode perfeitamente incluir uma avaliação, sem que se tenha que recorrer ao expediente da limitação temporal do chamado.
- Conclusão: embora a limitação temporal do chamado seja lícita e possível, há razões que apontam para a não-conveniência de tal prática. Há outros dispositivos sancionados pela Escritura que ajudam a solucionar as questões que se quer resolver pela limitação temporal do chamado.