V
TRATADO SOBRE O PODER
E O PRIMADO DO PAPA
Introdução
Ainda que os representantes da Liga de Esmalcalde, que se
reuniram em Esmalcalde em fevereiro de 1537, não tivessem aceito os Artigos
preparados por Lutero (Vid. Introdução aos Artigos de Esmalcalde, acima),
sentia-se a necessidade de dizer algo sobre o papa e seu poder, especialmente
em vista do fato de o Papa Paulo III ter convocado, para o ano seguinte, um
concílio da Igreja a reunir-se em Mântua. Chamou-se a atenção para o fato de
que, originalmente, tinha sido a intenção incluir uma declaração sobre o assunto
na Confissão de Augsburgo e que tal declaração fora omitida em Augsburgo
unicamente para evitar ofender o imperador e chegar, assim, ao fim da discussão
das diferenças religiosas. Uma vez que as circunstâncias agora pareciam exigir
o que antes fora deixado de lado, os clérigos que estavam presentes em
Esmalcalde foram instruídos a preparar uma declaração desse tipo. Eles, por sua
vez, confiaram a matéria a Felipe Melanchthon, que, em poucos dias, escreveu o Tratado
sobre o Poder e o Primado do Papa.
Diferentemente dos Artigos de Esmalcalde, o
Tratado foi oficialmente aceito, em Esmalcalde, como confissão de fé.
Destinava-se a ser um suplemento à Confissão de Augsburgo e não,
como habitualmente se supõe, um apêndice aos Artigos de Esmalcalde.
Todos os clérigos que estavam presentes assinaram o Tratado. A assinatura de
Lutero falta porque ele estava doente demais para estar presente ao encontro.
Do Poder e Primado do Papa[1]
Arroga-se o bispo romano a posição de estar, de direito
divino, acima de todos os bispos e pastores[2].
Em seguida, acrescenta ainda que possui, de direito divino, ambas as espadas,[3]
isto é, a autoridade de conferir e transferir reinos. E em terceiro lugar diz que crer isso é
necessário para a salvação.[4]
E por essas razões o bispo romano chama a si vigário de Cristo na terra[5].
Julgamos e confessamos que esses três artigos são falsos, ímpios, tirânicos e
perniciosos à igreja. Agora, para que se possa entender nossa afirmação,
definiremos primeiro o que chamam estar acima de todos os bispos de direito
divino. Entendem que o papa é bispo universal, e, como eles mesmos dizem,
ecumênico, isto é, junto ao qual todos os bispos e pastores, do mundo inteiro,
deveriam buscar ordenação e confirmação, que deve ter o direito de eleger,
ordenar, confirmar e depor todos os bispos. Arroga a si, além disso, a
autoridade de fazer leis concernentes a cultos, a mudança dos sacramentos, a
doutrina, e quer que seus artigos, seus decretos, suas leis sejam havidos por
artigos de fé ou mandamentos de Deus que obriguem as consciências, porque se
atribui poder de direito divino; quer até que seu poder seja preferido aos
mandamentos de Deus. E mais horrível ainda é o que acrescenta: ser necessário
para a salvação crer tudo isso.
I. Mostremos, pois, em primeiro lugar, do evangelho, que
o bispo romano não está por direito divino acima dos outros bispos e pastores.
Em Lucas 22[6], Cristo expressamente
proíbe a dominação entre os apóstolos. Pois essa foi exatamente a questão:
quando Cristo falou de sua paixão, discutiam sobre quem haveria de exercer o
governo e ser, e, por assim dizer, funcionar como vigário do Cristo ausente. Aí
Cristo repreende esse erro dos apóstolos e ensina que não haverá entre eles
dominação ou superioridade, mas que os apóstolos deveriam ser enviados como
iguais ao comum ministério do evangelho. Diz, por isso: "0s reis dos povos
os dominam, mas vós não fareis assim; pelo contrário, qualquer que quiser ser o
maior entre vós, será vosso servo." Aqui a antítese mostra que a dominação[7]
é desaprovada. Ensina a mesma coisa a parábola[8],
quando Cristo, nessa mesma discussão sobre o reino, coloca uma criança no meio
deles, significando que entre ministros não haverá de existir domínio, assim
como uma criança não toma nem procura para si qualquer domínio.
II. Em João 20[9]
Cristo da mesma maneira[10]
envia os apóstolos sem distinção,[11]
quando diz: “Assim como o pai me enviou, eu também vos envio”. Diz que os envia
individualmente da mesma forma como ele foi enviado. Por isso a nenhum atribui
prerrogativa ou dominação sobre os demais.
III. Em Gálatas 2[12]
Paulo afirma claramente que não foi ordenado nem confirmado por Pedro. Tampouco
reconhece a Pedro como alguém junto ao qual se deva procurar confirmação. E
nomeadamente discute a esse respeito que sua vocação não depende da autoridade
de Pedro. Mas deveria ter reconhecido Pedro como superior, se Pedro era
superior de direito divino. Paulo diz, por isso[13],
que ele, sem consultar Pedro, imediatamente ensinou o evangelho. Também: “A mim
não me importa quais tenham sido aqueles que pareciam ser alguma coisa. Pois
Deus não considera a aparência do homem”.[14]
Da mesma forma: “Aqueles que pareciam ser algo, nenhuma ordem me deram.”[15]
P[JH1] ortanto,
como Paulo claramente testifica que nem sequer quis procurar confirmação de
Pedro, mesmo quando chegara a ele, ensina que a autoridade do ministério
depende da palavra de Deus, e que Pedro não foi superior aos demais apóstolos,
e que não é necessário procurar ordenação nem confirmação dessa uma só pessoa
Pedro.
IV. Em 1Co 3[16]
Paulo iguala os ministros e ensina que a igreja está acima dos ministros. Razão
por que Pedro não se atribui superioridade ou domínio sobre a igreja ou os Pois diz assim: “Tudo é vosso: seja Paulo,
seja Ceras, seja Apolo”[17],
isto é: nem os outros ministros nem Pedro arroguem a si domínio ou
superioridade sobre a igreja, não onerem a igreja com tradições, não valha a
autoridade de ninguém mais que a palavra, não se oponha a autoridade de Cefas à
autoridade dos outros apóstolos, conforme argumentavam naquele tempo: Cefas,
que é apóstolo superior, observa isso; logo, tanto Paulo como os demais devem
observar isso. Paulo remove de Pedro essa magnificência[18]
e nega que sua autoridade deva ser anteposta aos demais ou à igreja. 1Pedro 5:
“Nem como dominadores dos que vos foram confiados”.[19]
Testemunho da História
V. O Concílio de Nicéia ordenou que o bispo de Alexandria
cuidasse das igrejas do Oriente, e o bispo romano cuidasse das suburbanas, isto
é, das que ficavam nas províncias romanas do Ocidente,[20]
Daqui, de direito humano, isto é, pela
ordenação conciliar, cresceu pela primeira vez a autoridade do bispo romano.
Agora, se o bispo romano tivesse possuído a superioridade de direito divino,
não houvera sido lícito ao concílio tirar-lhe qualquer direito L' transferi-lo
ao de Alexandria. Na verdade, todos os bispos do Oriente sempre deveriam ter
procurado ordenação e confirmação do bispo romano.
VI. O Concilio de Nicéia resolveu, igualmente, que os
bispos fossem eleitos por suas igrejas, na presença de algum bispo vizinho ou
de mais de um. Isso foi observado também no Ocidente e nas igrejas latinas,
conforme testificam Cipriano e Agostinho. Pois Cipriano, na epistola 4 a
Cornélio, diz assim[21]
"Por isso, segundo a tradição divina e a observância apostólica, deve ser
diligentemente guardado e praticado o que também se observa entre nós e em
quase todas as províncias: que, para celebrar as ordenações apropriadamente,
todos os bispos vizinhos da mesma província devem reunir-se com o povo para o
qual o preposto deve ser ordenado, e o bispo deve ser eleito na presença do povo
que conhece integralmente a vida de cada um, o que, segundo vimos, também foi
feito entre vós na ordenação do nosso colega Sabino, que, pelo sufrágio de toda
a fraternidade e pelo juízo dos bispos que se haviam reunido na presença deles,
o episcopado lhe foi conferido, e lhe foram impostas as mãos." A esse
costume Cipriano chama tradição divina e observância apostólica, e afirma que é
observado em quase todas as províncias. Como, portanto, nem ordenação, nem
confirmação foi buscada junto ao bispo romano na maior parte do mundo, nas
igrejas gregas e latinas, está suficientemente claro que as igrejas então não atribuíram
superioridade e dominação ao bispo romano.
Aquela superioridade é impossível. Pois é impossível que
um só bispo seja inspetor das igrejas do mundo inteiro, ou que igrejas situadas
nas terras mais remotas procurem a ordenação junto a um só. Pois é sabido que o
reino de Cristo está disperso por todo o mundo, e hoje há muitas igrejas no
Oriente que não buscam junto ao bispo romano a ordenação nem a confirmação. Por
isso, como aquela superioridade é impossível, e já que nunca esteve em uso nem
foi reconhecida pelas igrejas na maior parte do mundo, está suficientemente
claro que não foi instituída.[22]
VIII. Foram anunciados e realizados muitos concílios
antigos em que não presidiu o bispo romano, como o Niceno e muitos outro.[23]
Testifica também isso que então a igreja não reconheceu o primado ou a
superioridade do bispo romano.
IX. Diz Jerônimo[24]
"Se a questão é concernente à autoridade, o orbe é maior do que a urbe.[25]
Onde quer que tenha havido um bispo, seja em Roma, seja em Eugúbio[26],
seja em Constantinopla, seja em Régio, seja cm Alexandria, é ele da mesma
dignidade e do mesmo sacerdócio. É o poder da riqueza e a humildade da pobreza
o que torna superior ou inferior".
VIII. Gregório, escrevendo ao patriarca alexandrino[27],
proíbe que lhe chamem bispo universal. E nos regestos[28]
diz que no Concilio de Calcedônia o primado foi oferecido ao bispo romano, mas
não aceito.
IX. Por derradeiro, como é que pode o papa estar acima de
toda a igreja quando a igreja tem a eleição e pouco a pouco prevaleceu o
costume de que os bispos romanos eram confirmados pelos imperadores?
Da mesma forma, como por longo tempo tivesse havido
disputas sobre o primado entre o bispo romano e o constantinopolitano, o
imperador Focas[29] estabeleceu afinal que o
primado devia ser atribuído ao bispo romano. Mas se a igreja antiga houvesse
reconhecido o primado do romano pontífice, essa contenda não poderia ter
ocorrido, nem teria havido necessidade de um decreto do imperador.
Objetam, porém, com algumas passagens, como: "Tu és
Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja".[30]
Também: "Dar-te-ei as chaves"[31].
Igualmente: "Apascenta as minhas ovelhas"[32].
E mais algumas. Como, porém, toda essa controvérsia foi tratada copiosa e
acuradamente alhures, nos livros dos nossos, e visto não se poder recensear
tudo aqui, remetemos àqueles escritos e queremos que sejam tidos como
reiterados. Responderemos, todavia, brevemente, quanto à interpretação[33].
Em todas essas passagens Pedro é o representante de todo o grupo dos apóstolos,
conforme se evidencia do próprio texto. Pois Cristo não interroga somente a
Pedro, mas diz: "Vós, quem dizeis que eu sou?"[34]
E o que aqui é dito no número singular — "Dar-te-ei as chaves",
"o que ligares"[35]
—, em outro lugar é dito no plural: "O que ligardes, etc."[36]
E em João: "Aqueles a quem perdoardes os pecados, etc."[37]
Atestam essas palavras que as chaves são dadas igualmente a todos os apóstolos,
e que todos os apóstolos são enviados igualmente. Além disso, é necessário
reconhecer que as chaves não pertencem à pessoa de determinado homem, porém à
igreja, conforme atestam muitos argumentos claríssimos e firmíssimos. Pois Cristo,
falando das chaves, Mateus 18, acrescenta: "Onde quer que dois ou três
concordarem na terra, etc"[38].
De sorte que atribui as chaves principal e imediatamente à igreja, assim como
também por essa razão a igreja principalmente tem o direito de chamar. É necessário,
por isso, que nessas passagens Pedro seja o representante de todo o grupo dos
apóstolos. Razão por que não atribuem a Pedro qualquer prerrogativa, ou
superioridade, ou domínio.
Mas quanto à declaração: "Sobre esta pedra
edificarei a minha igreja"[39],
por certo que a igreja não foi edificada sobre a autoridade do homem, porém
sobre o ministério daquela profissão que Pedro fez, na qual proclama que Jesus
é o Cristo, o Filho de Deus. De sorte que se endereça a ele como ministro:
"Sobre esta pedra", isto é, sobre este ministério. Ora, o ministério
do Novo Testamento não está preso a lugares e pessoas como o ministério
levítico, porém está disperso pelo mundo inteiro e está onde Deus dá os seus
dons, apóstolos, profetas, pastores, doutores. E esse ministério não vale por
causa da autoridade de qualquer pessoa, mas por causa da palavra dada por
Cristo. E a maioria dos santos Pais, como Orígenes[40],
Ambrósio[41], Cipriano[42],
Hilário[43],
Beda[44],
interpretam a sentença "sobre esta pedra" desse modo, não como
referente à pessoa ou à superioridade de Pedro. Assim diz Crisóstomo[45]:
"Sobre esta pedra’, diz ele, não ‘sobre Pedro! Pois edificou sua igreja
não sobre o homem, mas sobre a fé de Pedro. Mas qual foi a fé? Tu és o Cristo,
o Filho do Deus vivo". Hilário[46]:
"A Pedro revelou o Pai que dissesse: Tu és o Filho do Deus vivo. A
edificação da igreja é, portanto, sobre a pedra dessa confissão. Essa fé é o
fundamento da igreja".
E quanto às palavras: "Apascenta as minhas
ovelhas"[47], da mesma forma:
"Amas-me mais do que estes?"[48],
daí ainda não se segue que a Pedro haja sido dada uma superioridade peculiar.
Pois ordena que apascente, isto é, que ensine a palavra ou reja a igreja com a
palavra, o que Pedro tem em comum com os demais apóstolos.
O segundo artigo é mais claro ainda: que Cristo deu aos
apóstolos somente poder espiritual, isto é, o mandamento de ensinarem o
evangelho, anunciarem a remissão dos pecados, administrarem os sacramentos,
excomungarem os ímpios sem recurso à força física, e não deu o poder da espada,
ou o poder de constituir, ocupar ou conferir reinos do mundo. Pois Cristo diz:
"Ide, ensinando-os a guardar as coisas que vos tenho ordenado"[49].
Da mesma forma: “Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio"[50].
Ora, é sabido que Cristo não foi enviado para manejar a espada ou possuir um
reino mundano, como ele mesmo diz: "O meu reino não é deste mundo!"[51].
E Paulo diz: “Não dominamos sobre a vossa fé"[52].
Igualmente: “As armas da nossa milícia não são carnais, etc"[53].
Agora, quanto ao fato de Cristo, em sua paixão, ser coroado com espinhos e
conduzido em púrpura real para ser objeto de zombaria, significou que
futuramente, depois de desprezado o reino espiritual, isto é, depois de
sufocado o evangelho, seria constituído um outro reino, mundano, com pretexto
de poder eclesiástico. Razão por que a constituição[54]
de Bonifácio VIII, capítulo Omnes, distinção vigésima segunda[55],
e sentenças similares, que contendem ser o papa o senhor dos reinos do mundo
por direito divino, são falsas e ímpias. Dessa persuasão foram trazidas para
dentro da igreja trevas horríveis. Depois também surgiram grandes comoções na
Europa. Pois foi negligenciado o ministério do evangelho. Foi extinto o
conhecimento da fé e do reino espiritual, e julgava-se que a justiça cristã era
aquele governo externo que o papa constituíra. Em seguida, os papas começaram a
arrebatar reinos para eles, transferiram reinos, vexaram com injustas
excomunhões e guerras os reis de quase todas as nações da Europa, mas
principalmente os imperadores germânicos, ora para ocupar cidades italianas,
ora para reduzir a sua servidão bispos da Alemanha e arrancar aos imperadores a
concessão de bispados[56],
E. mais do que isso, até está escrito nas Clementinas[57]:
"Quando o império está vacante, o papa é o legitimo sucessor". Assim
o papa não só usurpou dominação contra a ordem de Cristo[58],
mas ainda exaltou a si mesmo tiranicamente acima de todos os reis[59].
E nessa questão o próprio fato não deve ser repreendido tanto quanto se deve
detestar o pretextar ele a autoridade de Cristo, o transferir as chaves a um
reino mundano, o prender a salvação a essas ímpias e nefastas opiniões, quando
diz ser necessário para a salvação que os homens creiam que essa dominação
compete ao papa de direito divino. Como esses grandes erros obscurecem a fé e o
reino de Cristo, de modo nenhum devem ser dissimulados. Pois o resultado mostra
que foram grandes desgraças para a igreja.
Em terceiro lugar, deve acrescentar-se o que segue. Ainda
que o bispo romano tivesse o primado e a superioridade por direito divino,
contudo não seria devida obediência aos pontífices que defendem cultos ímpios,
idolatria e doutrina que pugna com o evangelho. Na verdade, tais pontífices e
tal reino deveriam ser tidos por malditos. Assim ensina claramente Paulo: “Se
um anjo do céu ensinar outro evangelho, que vá além do que vos ensinei, seja
anátema"[60]. E em Atos: “Mais importa
obedecer a Deus do que aos homens"[61].
Da mesma forma também os cânones[62]
claramente ensinam que não se deve obedecer a um papa herético. O pontífice
levítico era sumo sacerdote de direito divino e, contudo, não se devia obedecer
a sumos sacerdotes ímpios, como Jeremias e outros profetas dissentiam de sumos
sacerdotes. Os apóstolos dissentiam de Caifás e não lhe tinham de obedecer.
Ora, consta que os romanos pontífices com seus aderentes defendem doutrina
ímpia e cultos ímpios. E as notas do anticristo claramente concordam com o
reino do papa e seus membros. Pois que Paulo, em Tessalonicenses, ao descrever
o anticristo, lhe chama “adversário de Cristo, que se exalta sobre tudo que se
chama Deus ou se adora como Deus, e se assenta no templo de Deus como se fosse
Deus"[63]. Fala, portanto, de
alguém que reina na igreja, não de reis gentílicos, e a ele chama “adversário
de Cristo", porque haverá de excogitar doutrina que pugne com o evangelho
e arrogar-se-á autoridade divina. Mas é certo, em primeiro lugar, que o papa
reina na igreja e constituiu esse reino para si a pretexto de autoridade
eclesiástica e do ministério. Pois pretexta estas palavras: “Dar-te-ei as
chaves"[64]. Depois, a doutrina do
papa conflita de muitas maneiras com o evangelho, e o papa se arroga autoridade
divina de forma tríplice. Primeiro, porque se arroga o direito de mudar a
doutrina de Cristo e cultos instituídos por Deus, e que sua própria doutrina e
seus próprios cultos sejam observados como divinos. Segundo, visto que se
arroga não só o poder de desligar e ligar nesta vida, mas também o direito
quanto às almas depois desta vida. Terceiro, porque o papa não quer ser julgado
pela igreja, ou por quem quer que seja, e põe sua autoridade acima do juízo dos
concílios e de toda a igreja[65].
Mas não querer ser julgado pela igreja ou por quem quer que seja, isso é
fazer-se Deus a si mesmo. Em último lugar, esses erros, tão horríveis, e essa
impiedade, ele os defende com suma crueldade e mala os que dissentem.
Como esta é a situação, todos os cristãos devem
acautelar-se para não acontecer se tornem participantes da ímpia doutrina, das
blasfêmias e injustas crueldades do papa. Por isso devem abandonar e execrar o
papa com os seus membros como o reino do anticristo, conforme ordena Cristo:
“Acautelai-vos dos falsos profetas"[66].
E Paulo ordena que mestres ímpios devem ser evitados e execrados como malditos[67].
E em 2Co 6 diz: “Não vos ponhais em jugo desigual com os incrédulos; porquanto,
que sociedade pode haver da luz com as trevas?"[68]
Dissentir do consenso de tantas gentes e ser chamado de
cismático é grave. Mas a autoridade divina manda a todos que não sejam aliados
e propugnadores de impiedade e injusta crueldade. Em razão disso as nossas
consciências estão suficientemente escusadas. Pois os erros do reino papal são
manifestos.
E a Escritura clama a vozes bradadas[69]
que aqueles erros são doutrina de demônios e do anticristo[70].
Manifesta é a idolatria na profanação das missas, que, além de outros vícios,
são impudentemente empregadas para obter torpíssimos ganhos. A doutrina do
arrependimento foi totalmente corrompida pelo papa e seus adeptos. Pois ensinam
que pecados são remitidos por causa da dignidade de nossas obras. Depois ordenam
que duvidemos sobre se a remissão se dá. Em parte, nenhuma ensinam que os
pecados são perdoados de graça, por causa de Cristo, e que mediante esta fé
conseguimos a remissão dos pecados. Dessa maneira obscurecem a glória de
Cristo, e privam as consciências de consolação firme, e abolem cultos
verdadeiros, a saber, os exercícios da fé que luta com o desespero.
Obscureceram a doutrina do pecado e inventaram uma
tradição sobre a enumeração dos delitos que produz muitos erros e desespero.
Falsamente acrescentaram satisfações, pelas quais também obscureceram o
benefício de Cristo. Disso nasceram indulgências, que são puras mentiras,
excogitadas por causa de ganho. Depois, quantos abusos e quão horrenda
idolatria gerou a invocação dos santos! Quantas torpezas se originaram da
tradição sobre o celibato! Com que trevas a doutrina dos votos cobriu o
evangelho! Aí imaginaram que os votos são justiça diante de Deus e que merecem
remissão de pecados. Assim transferiram o benefício de Cristo a tradições
humanas e extinguiram inteiramente a doutrina concernente à fé. Inventaram que
tradições futilíssimas são cultos de Deus e perfeição, e as preferiram às obras
das vocações que Deus requer e ordenou. E não se deve ter esses erros na conta
de leves. Pois lesam a glória de Cristo e levam ruína às almas. E não podem ser
dissimulados. Depois, a esses erros acrescem dois pecados ingentes. Primeiro,
que ele defende esses erros com injusta crueldade e pena de morte. Segundo, que
arranca o juízo à igreja e não permite que controvérsias eclesiásticas sejam
julgadas segundo a maneira correta. Até contende que ele está acima do concílio
e que pode anular os decretos dos concílios, conforme de vez em quando
declaram, despudoradamente, os cânones[71].
Mas os exemplos atestam que isso foi feito de maneira muito mais desavergonhada
pelos pontífices[72]. Na questão nona, três[73],
diz o cânone: "Ninguém julgará a primeira sé. Pois o juiz não é julgado
nem pelo imperador, nem por todo o clero, nem pelos reis, nem pelo povo".
Assim o papa exerce dupla tirania: defende seus erros pela força e mediante
homicídios, e veta exame judicial. Essa última prejudica ainda mais do que
qualquer suplicio. Porque, tirado o verdadeiro julgamento à igreja, não podem
ser eliminados os dogmas ímpios e os cultos ímpios, e por muitos séculos eles
destroem inúmeras almas.
Considerem, por conseguinte, os piedosos os grandes erros
do reino papal e sua tirania, e ponderem primeiro que os erros devem ser
rejeitados e a doutrina verdadeira abraçada, por causa da glória de Deus e da
salvação das almas. Ponderem também depois quão grande crime é auxiliar a
injusta crueldade no assassínio de santos, cujo sangue Deus sem dúvida há de
vingar.
Mas importa que especialmente os membros principais da
igreja, os reis e os príncipes, se interessem pela igreja e cuidam no sentido
de que os erros sejam eliminados e as consciências saradas, conforme Deus
nomeadamente exorta os reis: "Agora, pois, ó reis, sede prudentes;
deixai-vos advertir, juízes da terra"[74].
Pois o primeiro cuidado dos reis deve ser adornar a glória de Deus. Razão por
que seria indigníssimo conferirem eles sua autoridade e poder para confirmar a
idolatria e número infinito de outras infâmias, e para a matança de santos.
E ainda que o papa celebre concílios, como pode a igreja
ser sanada se o papa não tolera que qualquer coisa seja decretada contra o seu
arbítrio, se a ninguém concede que externe seu parecer, exceto aos seus
adeptos, aos quais prendeu com horríveis juramentos e maldições à defesa de sua
tirania e impiedade, sem qualquer limitação da palavra de Deus? Como, porém, as
sentenças dos concílios são as sentenças da igreja, não dos papas, cabe
especialmente aos reis reprimir a licença dos pontífices e fazer que não seja
arrancada à igreja a faculdade de julgar e decretar a partir da palavra de
Deus. E como os demais cristãos devem censurar os restantes erros do papa,
assim também devem repreender o pontífice que evade e impede o verdadeiro
conhecimento e o verdadeiro juízo da igreja.
Consequentemente, ainda que o bispo romano tivesse o
primado de direito divino, não obstante, desde que defende cultos ímpios e
doutrina que conflita com o evangelho, não lhe é devida obediência. Até é
necessário adversá-lo como anticristo.
Os erros do papa são manifestos e não são leves. Manifesta
é também a crueldade que exerce contra os piedosos. E sabe-se que é mandamento
de Deus que fujamos a idolatria, a doutrina ímpia e a injusta crueldade. Em
vista disso, todos os piedosos têm razões magnas, necessárias e manifestas para
não obedecerem ao papa. E essas razões necessárias consolam os piedosos contra
todas as reprimendas que se costumam atirar-lhes com respeito a escândalos,
cisma[75]
e discórdia.
Mas os que concordam com o papa e defendem sua doutrina e
cultos, poluem-se com idolatria e opiniões blasfemas, tornam-se réus do sangue
dos piedosos que o papa persegue, lesam a glória de Deus e impedem o bem-estar
da igreja, porque confirmam erros e outras desgraças para toda a posteridade.
Do Poder e da Jurisdição dos Bispos
Na Confissão[76]
e na Apologia[77] expusemos o que em geral
tínhamos a declarar sobre o poder eclesiástico. Pois o evangelho atribui aos
que presidem às igrejas a comissão de pregar o evangelho, perdoar pecados,
administrar os sacramentos, e, além disso a jurisdição[78],
a saber, o mandato de excomungar aqueles cujas faltas são conhecidas e, por
outro lado, absolver os que se arrependem. E segundo a confissão de todos,
também dos adversários, está claro que esse poder de direito divino é comum a
todos os que presidem às igrejas, chamem-se pastores, presbíteros ou bispos. E
por isso Jerônimo[79]
ensina abertamente que nas cartas apostólicas todos os que presidem às igrejas
são tanto bispos como presbíteros, e cita de Tito[80]:
"Por esta causa te deixei em Creta, para que constituas presbíteros nas
cidades". E depois acrescenta: "É indispensável que o bispo seja
marido de uma só mulher". Da mesma forma Pedro[81]
e João[82]
chamam a si de presbíteros. E então acrescenta[83]:
“Mas que depois foi escolhido um para ser posto sobre os demais, isso foi feito
como remédio contra cisma, a fim de não acontecer que, com cada qual atraindo
para si, a igreja de Cristo se despedaçasse. Pois também em Alexandria, desde
Marcos Evangelista até o tempo dos bispos Esdras[84]
e Dionísio, os presbíteros sempre elegiam um dentre eles e o colocavam em lugar
mais elevado, chamando-o bispo. Assim como um exército estabelece um comandante
para si, os diáconos, por sua vez, elejam dentre eles um do qual saibam que é
ativo e o nomeiem arcediácono. Pois, excetuada a ordenação, que faz o bispo que
o presbítero não faça?"
Ensina, portanto, Jerônimo que os graus de bispo e
presbítero ou pastor são distintos por autoridade humana. E a própria coisa o
diz, porquanto o poder é o mesmo, como disse[85]
acima. Mas uma coisa posteriormente fez diferença entre bispos e pastores, a
saber, a ordenação. Porque foi estabelecido que um bispo ordenasse ministros em
várias igrejas. Como, porém, de direito divino não são diversos os graus de
bispo e pastor, é manifesto que a ordenação realizada por um pastor em sua
igreja é válida de direito divino.
Por isso, quando os bispos ordinários se tornam inimigos
do evangelho ou não querem conferir a ordenação, as igrejas retêm o direito
delas. Pois onde quer que esteja a igreja, aí existe o direito de administrar o
evangelho. Razão por que é necessário que a igreja retenha o direito de chamar,
eleger e ordenar ministros.
E esse direito é dom propriamente[86]
dado à igreja e que nenhuma autoridade humana pode arrebatar à igreja, como
também testifica Paulo em Efésios, quando diz: "Subiu, concedeu dons aos
homens"[87]. E enumera entre os dons
próprios[88] da igreja pastores e
mestres, acrescentando que tais são dados para o ministério, para a edificação
do corpo de Cristo. Por conseguinte, onde há igreja verdadeira, aí
necessariamente existe o direito de eleger e ordenar ministros. Assim como em
caso de necessidade até um leigo absolve e se torna ministro e pastor de outrem.
Como no caso da história narrada por Agostinho[89]
a respeito de dois cristãos num navio, dos quais um batizou o catecúmeno[90],
e este, batizado, depois absolveu o primeiro. Para cá pertencem as sentenças de
Cristo que atestam haver as chaves sido dadas à igreja, não apenas a certas
pessoas: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, etc”[91].
Por último, também a sentença de Pedro confirma isso:
“Vós sois sacerdócio real”[92];
palavras essas pertinentes à igreja verdadeira, a qual, já que somente ela tem
o sacerdócio, por certo que possui o direito de eleger e ordenar ministros. E
isso também o atesta um costume comuníssimo da igreja. Pois que antigamente o
povo elegia os pastores e os bispos. Depois vinha um bispo dessa igreja ou de
uma vizinha, o qual pela imposição das mãos confirmava o eleito, e a ordenação
outra coisa não foi senão essa aprovação. Posteriormente acresceram novas
cerimônias, muitas das quais descreve Dionísio. Mas esse é autor recente e
fictício, quem quer que seja,[93]
assim como também os escritos de Clemente são supositícios[94].
Depois pessoas ainda mais recentes acrescentaram: “Dou-te o poder de sacrificar
pelos vivos e pelos mortos”[95].
Mas nem isso se encontra em Dionísio.
De tudo isso fica evidente que a igreja retém o direito
de eleger e ordenar ministros. Razão por que, quando os bispos se tornam
heréticos ou não querem conferir a ordenação, as igrejas são obrigadas por
direito divino a ordenar pastores e ministros, em consulta com os seus pastores[96].
E a impiedade e tirania dos bispos é que dão causa a cisma[97]
e discórdia. Porque Paulo preceitua que bispos que ensinem e defendam doutrina
ímpia e cultos ímpios devem ser tidos por malditos[98].
Falamos da ordenação, que, ela só, como diz Jerônimo[99],
distinguia os bispos de outros presbíteros. Por isso não é necessária nenhuma
discussão das demais funções dos bispos. Nem é preciso, na verdade, falar da
confirmação, também não da consagração de sinos, que são quase as únicas coisas
que retiveram. Da jurisdição deve ser dito algo.
É certo que a jurisdição comum de excomungar os réus de
faltas manifestas pertence a todos os pastores. Isso transferiram tiranicamente
só a eles e o empregaram para a obtenção de ganho. Pois é certo que os
oficiais, como lhes chamam, fizeram uso de uma licença que não pode ser
tolerada, e, ou por motivo de avareza, ou por causa de outras cobiças,
atormentaram homens e os excomungaram sem qualquer procedimento legal devido.
Mas que tirania é essa de os oficiais nos estados terem o poder de, a seu
arbítrio, sem procedimento legal devido, excomungar homens? E em que espécie de
coisas abusaram desse poder! A saber: não na punição de delitos verdadeiros,
mas em casos de violação de jejuns ou dias de festa e ninharias que tais.
Somente puniam, de vez em quando, atos de adultério. E nisso muitas vezes
vexavam homens inocentes e honestos. Ora, como esse crime é gravíssimo,
certamente ninguém deve ser condenado sem o devido processo legal. Por
conseguinte, visto que os bispos transferiram tiranicamente a si essa
jurisdição e dela abusaram torpemente, não é necessário obedecer aos bispos por
causa dessa jurisdição. Mas como há causas justas de não obedecermos, também é
justo restituir essa jurisdição a pastores piedosos e cuidar em que seja
exercida legitimamente, para emenda da moral e a glória de Deus.
Resta a jurisdição naqueles casos que, segundo o direito
canônico, pertencem ao foro eclesiástico, como lhe chamam, e principalmente em
causas matrimoniais. Também essa os bispos têm de direito humano, e, de mais a
mais, não muito antigo, como de fato se evidencia do Codex e das Novellae de
Justiniano[100] que juízos quanto ao
matrimônio então foram da alçada dos magistrados. E, por direito divino, os
magistrados seculares são obrigados a fazer esses julgamentos, se os bispos são
negligentes. A mesma coisa concedem também os cânones[101].
Razão por que também não é necessário obedecer aos bispos por causa dessa
jurisdição. E, na verdade, já que criaram algumas leis injustas sobre o
matrimônio e as observam em seus tribunais, ainda por essa razão é necessário
constituir outras cortes. Porque as tradições respeito ao parentesco espiritual
são injustas[102]. Também é injusta a
tradição que proíbe o casamento de pessoa inocente depois do divórcio.
Também é injusta a lei que aprova genericamente todos os
esponsais[103] clandestinos e dolosos,
contra o direito dos pais. Injusta é, outrossim, a lei do celibato sacerdotal.
Existem nas leis deles ainda outros laços de consciências. Recitá-los todos
aqui não importa.
Basta haver declarado isto: que a respeito de questões
matrimoniais há muitas leis injustas do papa, por causa das quais os
magistrados devem constituir outros tribunais.
Como, portanto, os bispos devotados ao papa defendem
doutrina ímpia e cultos ímpios, e não ordenam mestres piedosos, e até auxiliam
a crueldade do papa, havendo, além disso, arrebatado a jurisdição aos pastores
e exercendo-a apenas tiranicamente; por derradeiro, visto que em causas
matrimoniais observam muitas leis injustas, há razões suficientemente numerosas
e necessárias por que as igrejas não os devem reconhecer como bispos. Eles
mesmos, entretanto, recordem-se que foram dadas riquezas aos bispos como
esmolas para a administração e o proveito das igrejas, conforme diz a regra[104]:
‘O benefício é dado por causa do ofício". Não podem, por isso, de boa
consciência possuir essas esmolas. E entrementes defraudam a igreja, que
necessita desses meios para sustentar ministros c auxiliar em estudos e cuidar
de certos pobres e para estabelecer tribunais, especialmente cortes
matrimoniais. Pois a variedade e magnitude das controvérsias matrimoniais é
tamanha, que há necessidade de um foro especial para elas, e para estabelecê-lo
são precisos os recursos da igreja. Pedro predisse que haveria bispos ímpios,
que abusariam das esmolas das igrejas para luxo e negligenciariam o ministério.
Saibam, pois, aqueles que defraudam a igreja que eles também haverão de pagar a
Deus a penalidade por esse crime.
Relação dos Doutores e Pregadores que Subscreveram a Confissão e a
Apologia, etc. 1537.
Por ordem dos ilustríssimos príncipes e das ordens e
cidades que professam a doutrina do evangelho, relemos os artigos da Confissão
apresentada ao Imperador na assembleia de Augsburgo, e, mercê de Deus, todos os
pregadores que estiveram presentes nesta assembleia de Esmalcalde, declaram,
concordes, que em suas igrejas creem e ensinam de acordo com os artigos da
Confissão e da Apologia. Declaram também que aprovam o artigo sobre o primado
do papa e de seu poder e sobre o poder e a jurisdição dos bispos que aqui,
nesta assembleia de Esmalcalde, foi apresentado aos príncipes. Subscrevem, por
isso, seus nomes.
Eu, Dr. João Bugenhagen, o Pomerano, subscrevo os artigos
da Confissão de Augsburgo, a Apologia e o artigo sobre o papado apresentado aos
príncipes em Esmalcalde
Também eu, Dr. Urbano Rhegius, superintendente das
igrejas no ducado de Lüneburg, subscrevo
Nicolau Amsdorf, de Magdeburgo, subscreveu
Jorge Espalatino, de Altenburg, subscreceu
Eu, André Osiander, subscrevo
Mestre Veit Dietrich, de Nurembergue, subscreve
Estêvão Agrícola, ministro em Hof, subscreveu de próprio
punho
João Drach, de Marburgo, subscreveu
Conrado Figenbotz subscreve a tudo
Martinho Bucer
Eu, Erhard Schnepf, subscrevo
Paulo Rhodius, pregador em Stettin
Gerhard Oemcken, ministro da igreja em Minden
Brixius Northanus, pregador em Soest
Simon Schneeweiss, pastor em Crailsheim
Eu, o Pomerano, subscrevo outra vez em nome de Mestre
João Brenz, conforme instrução dele
Filipe Melanchthon subscreve de próprio punho Antônio
Corvino subscreve de próprio punho, em seu próprio nome e no de Adão de Fulda
João Schlachinhauffen subscreve de próprio punho
Jorge Helt, de Forchheim
Miguel Caelius, pregador em Mansfeld
Pedro Geltner, pregador da igreja de Frankfurt
Dionísio Melander subscreveu
Paulo Fagius, de Estrasburgo
Wendalinus Faber, pastor de Seeburg, em Mansfeld
Conrado Öttinger, de Pforzheim, pregador do Duque
Ulrico de Württemberg[105]
Bonifácio Wolfhart, ministro da palavra na igreja de
Augsburgo João Aepinus, superintendente de Hamburgo, etc., subscreveu de
próprio punho
João Amsterdam, de Bremen, fez o mesmo João Fontanus,
superintendente do Baixo Hesse, subscreveu Frederico Myconius subscreveu por
sua pessoa e por Justus Menius Ambrósio Blaurer
[1] Sobre
a posição de Melanchthon quanto ao papado cf. acima, Artigos de Esmalcalde,
Signatários, as observações dele na subscrição. WATR V Nº 5551, CR II, 744-746,
IV, 530 s. XII, 200-206 (Oratio de pontificum Ronutnorum ambitione,
monarchia, tyannide, 1556), WABr XII. 116, WA XI. 375-379.
[2] Cf.
p. ex., Decretum Gratiani, Parte I, distinção 21, capítulo 3º; distinção
22, capítulos 1º e 2º.
[3] Cf.
especialmente a bula Unam sanctam, de Bonifácio VIII (1302 — BSLK e ed. Tappert
indicam, erroneamente, 1301, ano da bula Ausculta fili, em que Filipe IV
é convocado por Bonifácio VIII para um sínodo em Roma —). Lê-se na bula (Corpus
juris canonici Extrav. comm. I, 8 C. l): In hac ejusque [i.e., ecclesiae]
potestate duos esse gladios, spiritualem videlicet et temporalem,
evangelicis dictis instruimur... Sed is quidem pro ecclesia, ille vero ab
ecclesia exercendus (“Ensinam-nos as palavras do evangelho que nela (i.e.,
na igreja) e em seu poder há duas espadas, a saber, a espiritual e a
temporal... Mas esta, por certo, deve ser exercida a favor da igreja, aquela,
porém, pela igreja”). A bula refere-se a Lc 22.38: “Então lhe disseram: Senhor,
eis aqui duas espadas. Respondeu-lhes: Basta”. Bonifácio argumenta que o Senhor
não respondeu que duas espadas era demais, porém: Satis est (cf. C.
Mirbt, Quellen zur Geschichte des Papsttums und des römischen Katholizismus,
4ª ed., Tubinga, 1924, número 372, p. 210).
[4] Nas
palavras finais da bula Unam sanctam (1302). Bonifácio VIII declara que
a toda criatura humana é de necessidade absouta para a salvação estar sujeita
ao romano pontífice: Porro subesse Romano pontifici omni humanae creaturae
declaramus... omnino esse de necessitate salutis (Denzinger-Bannwart, Enchiridion
symbolorum, definitionum et declarationum de rebus fidei et morum, 15ª ed.,
Umberg, 469). O Concílio de Constança (1418) condenou como sendo artigo 41 de
João Wycliffe a sentença de que não é necessário para a salvação crer que a
Igreja Romana é suprema entre as demais igrejas (non est de necessitate
salutis credere Romanam ecclesiam esse supremam inter alias ecclesias —
Texto latino citado em BSLK, p. 471, nota 4). Cf. a respeito WA II, 279 e 643.
[5] Designação
usada pelos papas desde Inocêncio III (1198-1216). Na bula Unam sanctam
(1302), Bonifácio VIII declara que Cristo e seu vigário constituem uma só
cabeça (Mirbt, op. cit., p. 148). Durante muitos séculos foi costume designar
com o título “Vigário de Cristo” aos bispos. Ainda no século XIII Tomás de
Aquino escreve que os apóstolos e seus sucessores são vigários de Deus (Summa
Theologiae, III, q, 64, art. 2, conclusio).
[6] Lc
22.24-27.
[7] O
texto alemão acrescenta: “entre os apóstolos”.
[8] Mt
18.14.
[9] Jo
20.21.
[10] Bente-Dau,
Concordia Triglotta, p. 505: “on an equality”. Ed. Tappert, p.
321: “as equals”. No original: pariter. Texto alemão: zugleich
(BSLK: in gleicher Weise).
[11] Texto
alemão acrescenta: dass einer weder mehr noch weniger Gewalt soll haben dann
der ander (“de modo que um não deve ter nem mais nem menos poder que o
outro”).
[12] Gl
2.2,6.
[13] Ed.
Tappert, p. 321: “however”. No original, ideo. Texto alemão: darumb.
[14] Gl
2.6. Na ed. Tappert (p. 321) falta a tradução das palavras: Personam
enim hominis Deus non accipit.
[15] Gl
2.6.
[16]
1Co 3.4-8.
[17]
1Co 3.21-22. Em BSLK falta a indicação do versículo 21.
[18] Hunc
praetextum. “Magnificência” é um dos sentidos de praetextus. Texto
alemao: Paulus zeuget Petro dies Hutlin ab (literalmente: “Paulo tira a
Pedro esse chapeuzinho”, isto é, tira-lhe a posição de domínio). Bente-Dau (Concordia
Triglotta, p. 507) e Tappert (p. 321) traduzem “pretexto”.
[19] 1Pe
5.3. No original: Non dominantes in clero. Vulgata Clementina: Neque
ut dominantes in cleris.
[20] Trata-se
do cânone 6º, famoso por causa das polêmicas quilométricas travadas em torno
dele. No original (J. D. Mansi, ed., Collectio conciliorum, II,
669, 671): Tà arkhaia éthê krateitó tà en Aigúptõ kaí Libúê kaì Pentapólei,
hôste tòn Alexandreías epískopon pántôn
toútôn ékhein tén exousían, epeidê kaì tô en té Rômê episkópô toüto
súnêthés estin (“Prevaleçam os costumes antigos observados no Egito, na Líbia
e na Pentápole, que o bispo de Alexandria tenha autoridade sobre todas essas,
já que isso também é o costume para o bispo de Roma”). Discute-se até hoje
sobre o sentido da última oração: se também é costume do bispo de Roma ter
jurisdição sobre os bispos de territórios adjacentes, ou se também é costume do
bispo de Roma reconhecer as prerrogativas do bispo de Alexandria.
[21] Epist.
67 ad Felicem presbyterum et Aelium diaconum, CSEL IIIII, 739.
[22] Texto
alemão: nicht von Christo eingesetzt und nicht aus gottlichem Rechten kommet
(“não foi instituída por Cristo e não provim de direito divino").
[23] Vid.
o parecer de Melanchthon: Dass die Kaiser Macht haben, Concilia
auszuschreiben, Anno 1536 (“Que os imperadores têm poder de convocar
concílios"), Archiv für Reformationsgeschichte, XXIII, 1926, p.
271,272,274,283-286; CR III, 134-136. Sobre a hipótese de um concilio reunir
sem autoridade papal vid, a famosa cláusula da bula In minoribus agentes,
de Pio II, di¬rigida à Universidade de Colônia, em 1463 (texto latino em Bullarium
diplomatum et privilegiorum sanctorum Romanorum pontificum, ed. de S.
Franco e A. Dalmazzo, Turim, 1860, vol. V, p. 180): Veneramur enim
Constantiense concilium et cuncta quae praedecessoribus approbata, inter quae
nullum invenimus umquam fuisse ratum, quod, stante Romano indubitato praesule,
absque ipsius auctoritate convenerit ("Pois veneramos o Concílio de
Constança e todos os que foram aprovados pelos [nossos] predecessores, entre os
quais nunca encontramos algum ratificado que, havendo presidente romano
indubitado, se tenha reunido sem sua autoridade").
[24] Epist.
146 ad Euangelum, MSL XXII, 1194. Vid. Artigos de Esmalcalde, II Parte,
IV Artigo, 9, nota em “Jerônimo".
[25] Ou:
o mundo é maior do que Roma.
[26] A
Gubbio de hoje, na Úmbria, na escarpa meridional dos Apeninos, ao noroeste de
Perugia. Atestado como bispado já no tempo de Silvestre I (314/37).
[27] Gregório
I, o Grande (c. 340-604). Epist. lib. VIII ep. 30 ad Eulogium, episcopum
Alexandrinum, MSL LXXVII, 933.
[28] Regestos:
registros de documentos, fatos, etc. Epist. lib. V ep. 43 ad Eulogium,
episcopum Alexandrinum, et Anastasium, episcopum Antiochenum, MSL LXXVII,
771.
[29] Em
607 o Papa Bonifácio III conseguiu que o imperador Focas (602/10) reconhecesse
Roma como "caput omnium ecclesiarum" (cabeça de todas as igrejas).
Cf., p. ex., Herzog-Hauck, Realencyklopädie für protestantische Theologie
und Kirche, III, 3 ed., p. 289.
[30] Mt
16.18.
[31] Mt
16.19.
[32] Jo
21.17.
[33] Quanto
à interpretação das passagens citadas. Texto alemão: bemeldte Spruch.
[34] Mt
16.13.
[35] Mt
16.19.
[36] Mt
18.18.
[37] Jo
20.23.
[38] Melanchthon
combina os versículos 19 e 20 de Mt 18. O texto alemão cita o versículo 20 (Wo
zwen oder drei versammelt sind in meinem Namen) e acrescenta: “Da mesma
forma Cristo dá o juízo supremo e final à igreja ao dizer: ‘Dize-o à igreja’”
[Mt 18.17].
[39] Mt
16.18.
[40] Comment.
in Matth, tom. XII, 11, MSG XIII, 1000.
[41] Ambrosiaster,
Comment. in epist. ad Ephesios cap. 2,20, MSL XVII, 380.
[42] De
catholicae ecclesiae unitate cap. 4, MSL IV, 500.
[43] De
trinitate VI, 36 s., MSL X, 186 s.
[44] In
Matth, evang. expositio lib. III cap. 16, MSL XCII, 78 s.
[45] Não
foi possível averiguar esta citação. Mas cf., p. ex., In Matth, homil.
54(55), MSG LVIII, 534.
[46] Vid.
acima, 27, nota em “Hilário".
[47] Jo
21.17.
[48] Jo
21.15.
[49] Mt
28.19-20.
[50] Jo
20.21.
[51] Jo
18.36.
[52] 2Co
1.24.
[53] 2Co
10.4.
[54] A
bula Unam sanetam, de 1302.
[55] Decretum
Gratiani, Parte I, Distinção 22, capítulo I.
[56] Referência
à controvérsia das investiduras (1073-1122), resolvida com a Concordata de
Worms ou Pactum Calixtinum.
[57] Corp.
jur. can. Clementinae II, 11 c.2. As Clementinas (1314), também
chamadas Constituições, são de Clemente V.
[58] Mc
10.42s.
[59] Decretais
de Gregório IX (de 1234), livro I, 33, cap. 6º: ... quanta est inter
solem et lunam, tanta inter pontifeces et reges differentia cognoscatur
(“Quanta diferença vai entre o Sol e a Lua, tanta seja reconhecida entre os
pontífeces e os reis").
[60] Gl
1.8.
[61] At
5.29.
[62] Decretum
Gratiani, Parte I, Distinção 40, cap. 6º.
[63] 2Ts
2.3s.
[64] Mt
16.19.
[65] Cf.
Decr. Grat. P. I D.40 c.6, P.II C.9 q.3 c.13, e a bula Pastor
aeternus, (1513), de Leão X. Gelásio I (falecido em 496) já estabelecera a
sentença: Papa a nemine judicatur ("O papa por ninguém é julgado”).
[66] Ml
7.15.
[67] Tt
3.10.
[68] 2Co
6.14.
[69] Tota
voce.
[70] 1Tm
4.1.
[71] Cf.
Decretum Gratiani P.I D. 16, 17, 19 e 21: Decretais de Gregório
IX, I, 6 cap. 4º.
[72] Cf.,
p. ex., a bula Execrabilis, de 18 de janeiro de 1460, que muitos
consideram o fim do conciliarismo. Nela, Pio 11 condenou a quem ousasse apelar
do papa para um concilio futuro. Texto latino em Bullarium diplomatum et
privilegiorum sanctorum Romanorum pontificum, ed. de S. Franco e A.
Dalmazzo, Turim, 1860, V, 149-150: Execrabilis et pristinis temporibus
inauditus tempestate nostra inolevit abusus, ut a Romano pontifice, Jesu
Christi vicario, cui dictum est in persona b. Petri: 'Pasce oves meas’ et 'Quod
ligaveris super terram, erit ligatum et in coelis’, nonnulli spiritu
rebellionis imbuti, non sanioris cupiditate judicii, sed commissi evasione
peccati ad futurum concilium provocare praesumant, quod quantum sacris
canonibus adversetur quan- tumque reipublicae christianae noxium sit, quisquis
non ignarus jurium intelligere potest ("Implantou-se em nossa época
abuso execrável e inaudito em tempos prístinos. Alguns, imbuídos de espirito de
rebelião, presumem, não pelo desejo de juízo mais são, porém pelo da evasão de
penalidade por pecado, apelar do romano pontífice, vicário de Jesus Cristo, a
quem foi dito, na pessoa do bem-aventurado Pedro: 'Apascenta as minhas
ovelhas', e: ‘Tudo quanto ligares na terra, estará ligado também no céu’, para
um concilio futuro. Qualquer pessoa que não ignore a lei pode compreender
quanto isso contraria os sacros cânones e quão prejudicial é à república
cristã”). O infrator, diz a bula, incorre ipso facto em sentença de
execração, da qual não pode ser absolvido exceto pelo romano pontífice e em
artigo de morte (= quando prestes a morrer): a qua [sententia], nisi per
Romanum Pontificem, et in mortis articulo, absolvi non possit.
[73] Decretum
Gratiani P. II C.9 q.3 c.13.
[74] Sl
2.10.
[75] Sobre
esse termo vid. acima, Apologia XXVIII, 25, nota em “cisma".
[76] Confissão
de Augsburgo XXVIII.
[77] Apologia
da Confissão de Augsburgo XXVIII.
[78] Cf.
acima. Artigos de Esmalcalde, III Parte, Artigo IX.
[79] Epist.
146 ad Euangelum (Euagrium), MSL XXII, 1193s.
[80] Tt
1.5-7.
[81] 1Pe
5.1.
[82] 2Jo
vers. 1º, 3Jo vers. 1º.
[83] Isto
é, Jerônimo acrescenta, na Epístola a Evágrio.
[84] Esdram.
Lição correta: Heraclam. Melanchthon cita o texto de Jerônimo de acordo
com uma edição do Decretum Gratiani, que em muitas edições traz Esdram.
[85] Dixi.
No Livro de Concórdia latino de 1384: dixit.
[86] Ou:
exclusivamente. No original: proprie.
[87] Ef
4.8 e 11s.
[88] Ou:
exclusivos. No original: propria.
[89] Decretum
Gratiani. P.III D.4 c.36, como carta de Agostinho a Fortunato.
[90] No
original, o termo grego katêkhoúmenon.
[91] Mt
18.20.
[92] 1Pe
2.9.
[93] A
ed. Tappert (p. 332, nota 5) remete, erroneamente, ao escrito De
coelesti hierarchia, que trata da essência, das qualidades e das ordens dos
anjos. Melanchthon pensa na obra Peri tês ekklêsiastikês hierarkhias (De
eccleciastica hierarchia) cap. V, MSGIII 500-516. O escrito é de fins do V
século ou princípios do VI. O autor, que é desconhecido, usa o nome de
Dionísio, o Areopagita. (Cf. Atos 17.34). Já Lourenço Valla percebeu o caráter
pseudepifráfico desse e de outros escritos atribuídos ao Areopagita. Lutero
também se manifestou sobre obras atribuídas a Dionísio, dizendo não ser
verossímil que o autor seja o discípulo de Paulo. (Cf. WART II, número 2799 a
a.).
[94] Supposititia.
Supositício, supositivo: atrubuído falsamento a alguém, inautêntico. A
referência é aos Recognitionum libri X ad Jacobum ratrem Domini,
atribuídos ao bispo Clemente de Roma (falecido cerca do ano 100). A obra não é
de antes de fins do II século. Seu único escrito autêntico conhecido é a carta
geralmente chamada Primeira Epístola aos Coríntios.
[95] Com
as palavras: Accipe potestatem offerre sacrificium Deo missamque celebrare
tam pro vivis quam pro defunctis in nomine Domini, o bispo, por ocasião da
ordenação sacerdotal, confere ao sacerdote o poder de oferecer o sacrifício da
missa.
[96] A
ed. Tappert não traz a tradução das palavras adhibitis suis
pastoribus, que não aparecem no texto alemão. As palavras também não
aparecem na tradução inglesa da Concordia Triglortta, que se baseia num
texto latino que omite todo o período em que estão essas palavras (Livro de
Concórdia latino de 1584).
[97] Sobre
o termo cisma vid. Apologia XXVIII, 25, nota em “cisma”.
[98] Gl
1.7-9.
[99] Cf.
acima, seção 62, último período.
[100]
Cf. p. ex. Cod. Justiniani Lib. V tit. 1—27, Dig. 23 tit. 1-2 e Nov. 22.
[101]
Decretais de Gregório IX, V, 26, cap. 2º.
[102]
Texto alemão; "Pois que a proibição do casamento entre compadres é injusta".
[103]
Desponsationes, contratos de casamento.
[104]
Corp. jur. can. Liber Sextus I, 3 c. 15.
[105]
Vurtembergue e Vurtemberga são as formas aportuguesadas.