terça-feira, 10 de setembro de 2019

Ministério - introdução ao assunto


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Ministério

Introdução ao assunto

Introdução

Existe unanimidade entre os estudiosos de Marinho Lutero no sentido de que ele é um teólogo a quem apenas se faz jus, quando se avalia cuidadosamente o seu contexto histórico e o posicionamento dos seus interlocutores ou adversários. Exemplo dos mais contundentes para tal é a sua visão do ministério eclesiástico e do sacerdócio dos crentes, a sua concepção a respeito da ordenação ao ministério e do serviço dos bispos.[1]
Para Lutero, a questão do ministério nunca foi um ponto central, embora ganhasse, no decorrer de sua reflexão teológica, em meio aos sempre novos desdobramentos práticos e comunitários da Reforma, algum peso e, no fim da sua vida, até certa sistematização. Jamais aboliu o ministério, todavia criticou violentamente o seu ser e fazer vigentes e contribuiu, definitivamente, para a recuperação do seu caráter e da sua função bíblicos. Preferiu falar em ordenação ao ministério, em vez de consagração. Em época nenhuma, pôs em dúvida, por princípio, o episcopado. Diferenciou, no entanto, de forma insofismável entre este e o papado, o qual não só considerou supérfluo, mas pernicioso. Em qualquer abordagem concernente ao ministério, Lutero aplicou o seu critério ubíquo: a proclamação da Palavra de Deus. O mesmo sucede tanto no anunciar da Lei e do Evangelho quanto no ministrar dos sacramentos. Lutero destacou sobejamente, como tarefa única do ministério, estar a serviço da Palavra de Deus.

Os diferentes estágios no testemunho de Lutero a respeito do ministério


Quanto ao testemunho de Lutero a respeito do ministério, podem-se distinguir quatro etapas[2]. É temerário demarcá-las rigorosamente. A distinção ajuda apenas para ressaltar as ênfases exigidas pelas novas situações que se vão impondo.
A primeira etapa abrange os anos de 1517 a 1520: Lutero desenvolve a sua compreensão do sacerdócio dos crentes e batizados em oposição crescente à hierarquia dominante que resiste ao Evangelho.
A segunda, os anos de 1521 a 1523: Lutero insiste na importância de um ministério organizado e ordenado, em resposta crítica radical à perseguição do Evangelho pelas autoridades de Roma e seus seguidores e, concomitantemente, em reação ao individualismo e espiritualismo dos entusiastas.
A terceira, abrange os anos de 1524 a 1529: Lutero, em confrontação aberta com os entusiastas, desdobra como se interligam a palavra externa da pregação e a distribuição comunitária dos sacramentos com a palavra e ação internas do Espírito Santo. Interligação que, para o pregador de Wittenberg, acontece também por meio da atuação do ministério eclesiástico evangélico.
A quarta etapa ganha ímpeto após a Dieta de Augsburgo (1530): Lutero perde a esperança de que Roma ainda venha abraçar a Reforma. Razão pela qual caminha decididamente rumo à renovação eclesiástica, a partir do Evangelho redescoberto, nos territórios que aderiram à Reforma. Aí uma ponderação meticulosa referente ao ministério se torna imperativa devido à necessidade de novos pregadores e à questão da sua ordenação. Pois nenhum bispo — era ele que ordenava — tinha acompanhado a Reforma. E, com a consolidação das igrejas territoriais evangélicas, os padres e monges que, logo depois de 1517, tinham se engajado, em grande número, pelo enraizamento da Reforma, não eram mais suficientes, além de que muitos deles, entrementes, tinham falecido ou desistido do ministério devido a outros motivos. Não por último, Lutero percebe que é impossível continuar com medidas e leis de emergência, que agora lhe carecem de embasamento teológico.


[1] A controvérsia acalorada ao redor da percepção do ministério em Lutero cooperou bastante com a formação daquela opinião generalizada. A polêmica acerca da interpretação adequada do testemunho do reformador referente ao ministério, começou no século passado e parece não ter terminado. Resumidamente, trata-se de duas posições que se excluem. Uma corrente afirma que Lutero teria derivado o ministério do sacerdócio dos crentes. O protagonista desta visão é J. W. F. Höfling, falecido em 1853. Cf. M. KIESSIG, Johann Wilhelm Friedrich Höfling. Leben und Werk. Gütersloh : Gerd Mohn, 1991, p. 138ss. Outra corrente enfatiza que Lutero teria ressaltado a independência do ministério do sacerdócio dos crentes, sim, o confronto entre ambos. O paladino principal aí é A. F. Chr. Vilmar, falecido em 1868. Cf. F. W. KANTZENBACH, Gestalten und Typen des Neuluthertums, Gütersloh : Gerd Mohn, 1968, p. 99ss. Trabalhos mais recentes oferecem enfoques diferenciados da mesma problemática. R ex., H. LIEB ERG, Amt und Ordination bei Luther und Melanchthon. Göttingen : Vandenhoeck & Ruprecht, 1962, p. 235ss., fala em “bipolaridade na doutrina de Lutero sobre o ministério”, ou seja: uma vez o ministério é derivado do sacerdócio dos crentes, ao que corresponde a vocação pela comunidade e, outra vez, o ministério é instituído por Jesus Cristo, ao que corresponde a ordenação como transmissão do ministério. De resto, o pesquisador católico romano P. MANNS, Vater im Glauben. Studien zur Theologie Martin Luthers, Wiesbaden/Stuttgart : Steiner, 1988, p. 115ss., mostra que Lutero jamais consentiu com que adeptos da Reforma ministrassem a Ceia do Senhor em casas particulares, também não no início impetuoso da eclosão do movimento reformatório e nem mesmo em diáspora extrema (cf., p. ex., abaixo, p. 85,3-26). Sempre teria ligado o ato de ministrar o Sacramento do Altar à comunidade e ao ministério.
[2] Cf. B. LOHSE, Luthers Theologie, Göttingen : Vandenhoeck & Ruprecht, 1995, p. 307.





Obras Selecionadas de Lutero, v. 7, pp 25 a 36
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